Quando Não Há Mais Palavras, Somente Afeto

Por Glacy Calassa

Falaria com meus olhos e abraços, porque as palavras não conseguem dar conta de tudo que precisa ser dito e sentido.

Hoje quero trazer um fragmento de uma sessão de grupo multifamiliar que fizemos. Estávamos conversando sobre as sucessivas recaídas, angústias e dificuldades que elas geram quando lancei uma pergunta bem objetiva para o grupo, mas quem deveria responder eram os pacientes e não os familiares.

A pergunta era: imagine que um amigo querido estivesse em uma mesma situação que vocês relataram, fazendo uso de múltiplas drogas, com conflitos sérios com a família, sem conseguir parar, dizendo que vai parar, mas recaindo sucessivas vezes. O caos instalado! A pessoa te conta esta história e te pede um conselho, como você aconselharia esse amigo querido?

Gosto dessa pergunta, pois os pacientes começam a “olhar de fora”, em terceira pessoa e esse exercício pode trazer alguns insights. Surgiram conselhos interessantes: afaste-se dos amigos, lugares e pessoas que têm envolvimento com a droga, intensifique seu plano terapêutico, comece a frequentar uma igreja, e por aí vai. Teve um garoto, de 19 anos, que deu uma resposta diferente e é sobre ela que quero falar.

Esse garoto não olhou para os pais dele, olhou para os outros familiares e disse:

— Primeiramente o que faria era dar um abraço apertado, um abraço sem ter tempo para soltar. Não falaria nada, porque é difícil transmitir em palavras tudo que precisamos dizer nesse momento de dor, de esperança, de pedido de ajuda, nesse momento em que vemos quem amamos sofrendo e não sabemos bem o que fazer.

— Faria ele perceber que apesar de tudo que está acontecendo, de todas as suas dificuldades, de todas as dores causadas por ambas as partes, ele é amado e cuidado por mim. Sim, faria ele perceber que existe amor. Claro, existe também dor, frustração, raiva, mas, acima de tudo, existe AMOR!

— Falaria com meus olhos e abraços, porque as palavras não conseguem dar conta de tudo que precisa ser dito e sentido. Com meus olhos e abraços diria: não desiste, que estou com você! Não desiste de você! Eu não desisto de você!

— Contou que no momento de maior desespero em que passou a única coisa que queria era alguém que o abraçasse e dissesse: calma, vai ficar tudo bem!

Ao final de sua fala, quase todos os olhos do grupo estavam lacrimejando!
Ao final da sessão fiquei pensando que temos tanto para falar, tantas intervenções para fazer, mas existem momentos onde o afeto pode ser a melhor intervenção, a principal fala.

Sempre inicio o grupo dizendo que temos muitos pontos a serem melhorados enquanto sistema familiar, mas que o amor e a união de cada família é maior e mais forte que esses pontos. Precisamos sempre nos lembrar disso, e esse garoto lembrou a todos nós que o essencial é invisível aos olhos, como já dizia Antoine de Saint-Exupéry.

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