Tratamento Sim, Tortura Não!

Por Glacy Calassa

O que um paciente vai necessitar, a intensidade e a frequência, pode não ser a mesma de outra pessoa com o mesmo problema.

A área de dependência química sempre foi uma área de grande paixão para mim. Há nove anos atuo, estudo e pesquiso sobre o tema.

Contudo, ultimamente, ando muito desanimada com as políticas públicas e preocupada com os locais que ofertam tratamento, isso gerou o desejo de escrever essas linhas.

Infelizmente tenho ouvido relatos de tortura em locais de tratamento e corrupção de agências fiscalizadoras. Isso me entristece, preocupa e desanima. Dá desânimo atuar em uma área onde a corrupção parece lugar-comum, onde o discurso violador de direitos é escancarado. Frases do tipo: “Se precisar violar um direito para tratar, vou violar.”; “Ele vivia na rua, usando droga, em situação pior e agora está reclamando do que?”; “Está achando ruim, ‘cai pra dentro’ (expressão utilizada para chamar o outro para brigas corporais)”. Cada vez que ouço uma frase dessa, meu desalento cresce!

Trabalhamos com pessoas extremamente vulneráveis e há muito tempo existem inúmeras denúncias sobre o tema, inclusive pelo mecanismo de combate à tortura. Contudo, parece que muitos estão surdos e as más práticas perpetuam.

Simplesmente gostaria de dizer que trabalhar com dependência química é difícil sim, mas temos práticas e métodos com evidências científicas para serem aplicadas. Não tem motivo de perpetuar ideias de cura mágica, nas quais se justificam tratamentos sem fundamentação científica.

Peço, encarecidamente, aos profissionais da saúde, que não pactuem com tais práticas, que façam denúncias, mesmo que sejam anônimas. Aos familiares, que não cedam a profissionais e instituições que pregam uma cura milagrosa, nas quais ficam sem notícias de seu ente querido por meses. Dependência química é uma doença e precisa de um tratamento adequado. Infelizmente já tivemos vários pacientes que sofreram traumas irreversíveis em locais que prometeram cura e cuidado. Ficaram sequelas para toda a vida do paciente e de sua família.

Não podemos aceitar a naturalização de discursos de tratamentos desumanos e cruéis. A área da saúde precisa ser uma área protegida quanto a esse tipo de “negócio” que olha o mercado e o lucro acima do bem-estar do ser humano. Saúde é tudo que cada pessoa tem de mais importante e é muito triste ver essa mercantilização, na qual o que importa não é o melhor método e sim o que dá mais lucro. Não sou contra cada um lucrar, ao contrário, o profissional precisa ser bem remunerado e as instituições precisam sobreviver, mas isso pode ser feito com ética. Devemos sempre oferecer o melhor tratamento disponível, o mais validado, com seriedade e profissionalismo.

Glacy Calassa
Psicóloga — CRP 01/16290

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